terça-feira, 2 de junho de 2020

1ª e 2ª Promotorias de Justiça da Comarca de Santa Cruz/RN, emitem recomendação conjunta para Prefeitos

RECOMENDAÇÃO CONJUNTA Nº
 002/2020 – 1ª e 2ª PmJSC
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, por seus
representantes com atuação na 1ª e 2ª Promotorias de Justiça da Comarca de Santa Cruz/RN, no exercício de suas
atribuições legais, e com fulcro nos artigos 127 e 129, inciso III, da Constituição Federal, artigos 26, inciso I, e 27,
parágrafo único, inciso IV, da Lei nº 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público) e artigos 67, inciso IV, 68
e 69, parágrafo único, alínea d, da Lei Complementar Estadual nº 141/96 (Lei Orgânica do Ministério Público do Rio do
Grande do Norte), e, ainda,
CONSIDERANDO que compete ao Ministério Público, na forma do artigo 69, parágrafo único,
alínea “d”, da Lei Complementar Estadual nº 141/96, expedir recomendações visando ao efetivo respeito aos interesses,
direitos e bens cuja defesa lhe cabe promover, fixando prazo razoável para a adoção das providências pertinentes;
CONSIDERANDO que, nos termos do art. 4º da Resolução nº 164/2017, do Conselho Nacional do
Ministério Público, a recomendação pode ser dirigida, de maneira preventiva ou corretiva, preliminar ou definitiva, a
qualquer pessoa, física ou jurídica, de direito público ou privado, que tenha condições de fazer ou deixar de fazer
alguma coisa para salvaguardar interesses, direitos e bens de que é incumbido o Ministério Público;
CONSIDERANDO que o novo Coronavírus (COVID-19, CID 10: B34.2) é uma doença viral,
altamente contagiosa, que provoca, inicialmente, sintomas de resfriado, podendo causar manifestações graves como a
Síndrome Respiratória Aguda Grave;
CONSIDERANDO que, em 11.03.2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou status de
pandemia para o coronavírus, ou seja, quando uma doença se espalha por diversos continentes com transmissão
sustentada entre humanos;
CONSIDERANDO os sucessivos decretos expedidos pelo Governo do Estado do Rio Grande do
Norte, que dispõem sobre medidas temporárias para o enfrentamento da situação de emergência em saúde pública
provocada pelo novo Coronavírus (Covid-19);
CONSIDERANDO que o Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte, por meio da 1ª
Promotoria de Justiça de Santa Cruz/RN, instaurou, em 20/03/2020, o Procedimento Administrativo nº
31.23.2380.0000244/2020-13, destinado a acompanhar as ações de enfrentamento ao COVID-19 (coronavírus) nos
Municípios de Santa Cruz/RN, Campo Redondo/RN, Coronel Ezequiel/RN, Lajes Pintadas/RN, Jaçanã/RN, Japi/RN e
São Bento do Trairi/RN;
CONSIDERANDO o disposto no art. 268 do Código Penal, que prevê como crime a conduta de
“infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa”, com pena de “detenção, de um mês a um ano, e multa”, a qual é “aumentada de um terço, se o agente é funcionário da
saúde pública ou exerce a profissão de médico, farmacêutico, dentista ou enfermeiro” (parágrafo único);
CONSIDERANDO que o tipo penal, ao não especificar quais seriam essas determinações, configura
o que em doutrina se chama de “norma penal em branco”, havendo, assim, necessidade de ser complementada por
outros atos normativos, dentre os quais os decretos expedidos pelo Poder Público que regulamentam as medidas de
prevenção necessárias em face da pandemia, naquilo em que houver expressa determinação de prática ou abstenção de
conduta;
CONSIDERANDO que o Poder Público, no exercício de seu poder de polícia, possui a prerrogativa
de fiscalizar os cidadãos quanto ao cumprimento das normas locais, objetivando a efetivação do bem comum;
CONSIDERANDO que o poder-dever de polícia conferido à Administração Pública possibilita que
esta condicione ou restrinja, sem necessidade de prévia autorização judicial, o uso de bens, o exercício de direitos e a
prática de atividades privadas, com vistas a proteger os interesses gerais da coletividade;
CONSIDERANDO que, flagrante a irregularidade, pressupõe-se a legitimidade da ação fiscalizatória
e atuação dos agentes públicos do município; 
CONSIDERANDO a necessidade de que a Administração Pública, exercendo o seu poder de polícia,
atue na orientação e aplicação das sanções previstas em caso de descumprimento dos decretos, advertindo,
inicialmente, formalmente e por escrito, os responsáveis legais pelos estabelecimentos que insistam na prática vedada,
evoluindo para a aplicação de multas e demais sanções normativamente previstas, caso se constate reiteração;
CONSIDERANDO que os decretos sobre a pandemia do COVID-19, enquanto em vigor, possuem
presunção de legalidade, donde advém o dever legal de todo cidadão de respeitar a legislação em vigor, assim devendo
agir até a revogação do ato ou seu eventual afastamento pela via judicial;
CONSIDERANDO que as medidas de enfrentamento à pandemia, quando expedidas pelo meio
formalmente adequado e pela autoridade competente, com fundamento em argumentos técnicos e visando à proteção de
valores legítimos, possuem amparo constitucional, na defesa do direito fundamental à saúde (art. 6º da CF);
CONSIDERANDO ser fato público e notório que o novo coronavírus se expandiu rapidamente pelo
mundo, sem que exista, até o momento, vacina específica disponível ou processo seguro e cientificamente reconhecido
de cura, estando as diversas autoridades médicas e sanitárias e os laboratórios farmacológicos ainda em busca de
substâncias e protocolos mais adequados para o tratamento da doença, sem prejuízo dos protocolos de tratamento já
existentes;
CONSIDERANDO que eventual contaminação em massa da população, mesmo que haja baixo
percentual de casos graves, tem potencial para levar aos leitos de UTI, ao mesmo tempo, uma quantidade de pessoas
superior à capacidade de acolhimento dos estabelecimentos públicos e privados de saúde, daí advindo o risco de
elevado número de óbitos por falta de suporte hospitalar;
CONSIDERANDO que o Poder Público não pode transferir, exclusivamente para o cidadão, os ônus
decorrentes da pandemia, sob pena de descumprir sua missão constitucional, sendo, antes, seu dever o de propiciar
meios, a partir dos recursos públicos e das técnicas de tratamento disponíveis, para uma urgente melhoria na qualidade e
na abrangência dos serviços públicos de saúde, incluindo a ampliação do número de leitos e a realização de testagem
em massa da população para COVID-19, visando a uma atuação preventiva e precoce quanto às fases de agravamento
da doença;
CONSIDERANDO o amplo conhecimento, notadamente a partir de postagens veiculadas em redes
sociais, de que muitos munícipes não estão respeitando as medidas a todos impostas pelos decretos em vigor, cabendo
ao Ministério Público recomendar as providências cabíveis visando à efetivação do isolamento social;CONSIDERANDO a importância da expedição de orientação uniforme para os sete municípios da
Comarca de Santa Cruz/RN, haja vista que integram a mesma jurisdição, e que o enfrentamento à pandemia exige ações
coordenadas;
CONSIDERANDO que os meios de comunicação, a exemplo da televisão, do rádio e da rede
mundial de computadores, tem disseminado exaustivamente as medidas de isolamento social e as restrições impostas
por atos normativos estaduais e municipais, não se admitindo que a população em geral desconheça as regras vigentes,
notadamente considerando a realidade local, na qual os decretos estadual e municipais são convergentes entre si;
CONSIDERANDO, por fim, a necessidade de cumprimento da legislação expedida em razão da
pandemia do COVID-19, como medida de precaução, até que os estudos científicos em andamento apresentem soluções
adequadas para a cura da doença, compatibilizando-se, porém, tais medidas, com o respeito aos demais direitos e
garantias constitucionais em vigor;
RESOLVEM RECOMENDAR 
I – Aos Excelentíssimos Senhores Prefeitos dos Municípios de Santa Cruz/RN, Campo
Redondo/RN, Coronel Ezequiel/RN, Lajes Pintadas/RN, Jaçanã/RN, Japi/RN e São Bento do Trairi/RN:
1) que divulguem amplamente orientação à população local, nos seguintes termos: 1.1) para que
utilizem máscaras de proteção durante os deslocamentos em vias públicas e para atendimento em
estabelecimentos com funcionamento autorizado, recomendando-se que a circulação se limite às necessidades
imediatas de alimentação, cuidados de saúde e exercício de atividades essenciais; 1.2) que as pessoas em
quarentena, com casos suspeitos de COVID-19, devem obedecer, na íntegra, às determinações das autoridades
sanitárias municipais, estaduais e federais, sob pena de incorrerem na prática de crime;
2) que divulguem, orientem e fiscalizem os pontos de comércio da cidade, esclarecendo que: 2.1)
apenas poderão ser mantidos abertos os estabelecimentos listados no art. 4º, § 1º1
, e no art. 132
, ambos do Decreto
nº 29.583/2020, prorrogado e atualizado pelo Decreto nº 29.705, de 19 de maio de 2020; 2.2) que devem cumprir as
recomendações das autoridades sanitárias municipais, estaduais e federais, especialmente adotando os meios
necessários ao distanciamento social, por meio da organização das filas, dentro e fora do estabelecimento, pelo
controle de acesso de uma pessoa por família, pela disponibilização ininterrupta e suficiente de álcool gel 70%,
em locais fixos de fácil visualização e acesso, bem como as demais medidas elencadas no art. 14 do decreto citado;
3) Caso não estejam proibidas, que orientem, organizem e fiscalizem as feiras livres e similares,
para assegurar o distanciamento social e a higiene necessária, esclarecendo que: 3.1) é vedado qualquer tipo de venda
para consumo local (art. 19, § 1º, I, do Decreto nº 29.583/2020); 3.2) deverá ser mantido um distanciamento mínimo
entre as barracas de 2 (dois) metros, em todas as direções (art. 19, § 1º, II, do Decreto nº 29.583/2020), e ser feito
controle de fluxo de pessoas nas áreas de comercialização, mantendo-se o distanciamento de 1,5 metro (art. 19, § 1º,
1 Art. 4º Está suspenso o funcionamento de restaurantes, lanchonetes, praças de alimentação, praças de food trucks, bares e
similares, salvo para entrega em domicílio (delivery) e como pontos de coleta (takeaway), sendo vedada a disponibilização de mesas e
cadeiras.
§ 1º O disposto no caput não se aplica aos estabelecimentos comerciais localizados:
I - no interior de hotéis, pousadas e similares, desde que os serviços sejam prestados exclusivamente a hóspedes;
II - em unidades hospitalares e de atendimento à saúde, sem acesso de público externo;
III - em áreas de rodovia fora do espaço urbano das cidades, necessários a viabilizar o transporte e entrega de cargas em
geral, para o fornecimento de refeições prontas, como pontos de apoio ao caminhoneiro, sendo proibida a venda de bebidas alcoólicas.
§ 2º Na hipótese do § 1º, os estabelecimentos deverão observar, sob pena de multa e interdição, as recomendações da
autoridade sanitária e, especialmente, o distanciamento mínimo de 1,5 m (um metro e meio) entre as pessoas.
2 (conferir diretamente no decreto, tendo em vista a sua extensão);VI, do Decreto nº 29.583/2020); 3.3) é vedado o corte e colocar à exposição para consumo os produtos nas barracas
(art. 19, § 1º, III, do Decreto nº 29.583/2020); 3.4) deverá ser garantida a disponibilização de álcool 70% e de pias
com água e sabão que permitam a higienização das mãos de usuários e feirantes (art. 19, § 1º, IV, do Decreto nº
29.583/2020); e que deverão cumprir as demais determinações expostas no Decreto nº 29.583/2020, bem como
aquelas impostas pela Autoridade Sanitária Municipal; 
4) fiscalizem o cumprimento dos decretos em vigor quanto às atividades cujo funcionamento não
esteja autorizado pelo Poder Público, exercendo o poder de polícia administrativa em prol da garantia do bem-estar
coletivo e do interesse público relacionado ao combate à disseminação do coronavírus;
5) reforcem, por todos os meios de comunicação disponíveis (rádio, internet, carro de som, dentre
outros), a divulgação das medidas preventivas que devem ser adotadas para evitar infecção por coronavírus;
6) observem a legislação em vigor e as atualizações que houver sobre como devem proceder nos
casos de munícipes sob suspeita ou diagnosticados com SARS-CoV-2, inclusive determinando a realização
compulsória dos exames, testes e tratamento necessários, como expressamente permite o art. 3º e § 7º, II e III, da Lei
nº 13.979/2020;
7) apliquem os recursos públicos disponíveis em matéria de saúde mediante gestão célere e com
providências eficientes, dotando os hospitais, unidades de saúde, unidades de pronto atendimento e quaisquer outros
estabelecimentos de saúde sob sua responsabilidade, dos fluxos de atendimento necessários a uma adequada
prestação dos serviços públicos, priorizando a prevenção e uma intervenção eficiente nos primeiros estágios da
doença, inclusive após a superação da pandemia;
II ― Às Polícias Civil e Militar, que adotem as providências necessárias no sentido de fiscalizar a
presente Recomendação, orientando e prevenindo a realização de condutas que se enquadrem nas infrações acima
mencionadas; mas, para o fim de evitar-se abuso de autoridade e encarceramento em massa de pessoas em situação de
mero perigo hipotético, recomenda-se que somente conduzam e autuem penalmente aqueles cuja conduta estiver
gerando, concretamente, perigo de contágio a terceiros, ou que, estando em situação de evidente descumprimento de
determinação de saúde pública, assim decidam permanecer mesmo após o recebimento de ordem expressa do agente
para cessação da conduta ilegal;
III ― À população em geral dos Municípios de Santa Cruz/RN, Campo Redondo/RN, Coronel
Ezequiel/RN, Lajes Pintadas/RN, Jaçanã/RN, Japi/RN e São Bento do Trairi/RN: que cumpram todas as leis,
decretos e demais disposições legais em vigor sobre o enfrentamento à pandemia do novo coronavírus, até que haja
novo ato normativo modificando a situação ou decisão judicial em sentido diverso do estabelecido, evitando assim o
risco de responderem judicialmente pela eventual prática de crime.
Ficam todos advertidos de que a não observância desta Recomendação, desde que
injustificadamente, poderá ensejar o ajuizamento das ações cabíveis.
Por fim, determino à Secretaria Ministerial a adoção das seguintes providências:
1) remeta-se cópia eletrônica da presente Recomendação para a Coordenação do Centro de Apoio
Operacional às Promotorias de Defesa da Saúde do MPRN;
2) publique-se no DOE/RN;
3) encaminhe-se uma via desta Recomendação para os Prefeitos e Secretários Municipais de Saúde,
Comandante da 4ª CIPM/Santa Cruz, Delegado Regional de Polícia Civil de Santa Cruz/RN, preferencialmente por
meio eletrônico pessoal, comprovando-se nos autos;
4) encaminhe-se a presente Recomendação, por via eletrônica, às rádios e blogs da região, de
conhecimento desta Promotoria de Justiça, para ampla divulgação entre os munícipes da Comarca.
Santa Cruz/RN, 02 de junho de 2020.
(assinatura eletrônica)
Ricardo José da Costa Lima
1º Promotor de Justiça
(assinatura eletrônica)
Sandra Angélica Pereira Santiago
2ª Promotora de Justiça